Sinopse

A primeira premissa que nos conduzirá como um cego que guia outros cegos é o desejo de usarmos o texto As Criadas de Genet como um guia de viagens, como um manual de instruções para a construção de situações do espectáculo, mas silenciando o autor, emudecendo o texto na medida do possível. O uso de textos com um travo de clássicos na sua formulação e nos conteúdos que tratam é um desafio que permite aprofundar perguntas como: O que é que significa hoje fazer teatro? Como se joga este jogo ou de que peças é feita esta máquina?

As Criadas é um texto que mais uma vez, me aproxima do tema da morte. Aqui a morte é multiplicada e omnipresente nas suas formas e presenças: a morte como uma metamorfose do ser em busca de si e dos seus limites; a morte como um atrevimento uma provocação que leve a exceder as próprias forças em busca de uma paz que não deseja; a morte como um ideal de transformação que dá extensão aos movimentos de inquietação da imaginação; a morte como uma imagem que transporta consciência de si; a morte como desejo de afrontar aquilo que mais se teme; a morte como expressão de um outro que habita dentro de nós e que desconhecemos; a morte como uma união com a nossa própria imagem.

Será sobre o domínio de uma geometria do simbólico ou geometria significativa? Citando as didascálicas de Genet: “Os encenadores deverão esforçar-se por conseguir uma deambulação que nunca poderá ser fortuita: as Criadas e a Senhora andam de um lado para o outro no palco desenhando uma geometria significativa. Não posso dizer qual deva ser, mas sei que essa geometria não se deve limitar a simples idas e vindas. Deverá inscrever-se como, segundo se diz, se inscrevem no voo das aves os presságios, no voo das abelhas uma actividade de vida, nos passos de alguns poetas uma actividade de morte.”

Nos gestos e nos movimentos dos actores devem inscrever-se o quê? A vida? Uma transcendência para uma outra qualquer visão do mundo? Uma consciência que nos faça soçobrar e cair para dentro de nós mesmos experimentando sensações que nunca nos atreveríamos a fazer sem que nos empurrassem para tal? Nada? Apenas formas vazias que cada um desenha e utiliza como quiser? A morte? Na verdade não sei o que deve ter um gesto ou um movimento de um actor; mas atrevo-me a firmar que deve ser algo próximo da música, de um sentir que nos confronte a razão com o corpo, que nos permita espectadores do eu cairmos para dentro; que nos permita separar e imobilizar um gesto refazendo-lhe os sentidos possíveis; que nos permita começar a existir.

Ficha Técnica e Artística

Uma criação de João Garcia Miguel, com Interpretação de Miguel Borges e Anton Skrzypiciel e Produção Executiva de Marta Vieira.

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